sexta-feira, 27 de junho de 2008

Afronta à liberdade de expressão e acesso ao Ciberespaço


(Escrito por Sérgio Amadeu da Silveira)
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Na última semana, em uma sessão corrida e esvaziada, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o projeto de lei (PLC) 89/03 que define quais serão as condutas criminosas na Internet.
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Os exageros que constam do projeto podem colocar em risco a liberdade de expressão, impedir as redes abertas wireless, além de aumentar os custos da manutenção de redes informacionais. O mais grave é que o projeto apenas amplia as possibilidades de vigilância dos cidadãos comuns pelo Estado, pelos grupos que vendem informações e pelos criminosos, uma vez que dificulta a navegação anônima na rede. Crackers navegam sob a proteção de mecanismos sofisticados que dificultam a sua identificação.
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Veja o aburdo. Com base no artigo 22 do PLC 89/03, os provedores de acesso deverão arquivar os dados de "endereçamento eletrônico" de seus usuários. Terão que guardar os endereços de todos os tipos de fluxos, inclusive a voz sobre IP, as imagens e os registros de chats e mensagerias instantâneas, tais como google talk e msn.
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O pior. A lei implanta o regime da desconfiança permanente. Exige que todo o provedor seja responsável pelo fluxo de seus usuários. Implanta o "provedor dedo-duro". No inciso III do mesmo artigo 22, o PLC 89/03 exige que os provedores informem, de maneira sigilosa, à polícia os "indícios da prática de crime sujeito a acionamento penal público". Ou seja, se o provedor identificar um jovem "baixando" um arquivo em uma rede P2P, imediatamente terá que abrir os pacotes do jovem, pois o arquivo pode ser um MP3 sem licença de copyright. Mas, e se ao observar o pacote de dados reconhecer que o MP3 se tratava de uma música liberada em creative commons? O PLC implanta uma absurda e inconstitucional violação do direito à privacidade. Impõe uma situação de vigilantismo inaceitável.
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Como ficam as cidades que abriram os sinais wireless? A insegurança jurídica que o PLC impõe gerará um absurdo recuo nesta importante iniciativa de inclusão digital.
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Como fica um download de um BitTorrent? Deverá ser denunciado pelos provedores? Ou para evitar problemas será simplesmente proibido por quem garante o acesso?
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Como fica o uso da TV Miro (www.getmiro.com/)? Os provedores deverão se intrometer no fluxo de imagens e pacotes baixados pelo aplicativo da TV Miro?
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E um podcast? Como o provedor saberá se não contém músicas que violam o copyright? Se o arquivo trazer músicas sem licença, o provedor poderá ser denunciado por omissão? Pelo não cumprimento da lei?
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O PLC incentiva o temor, o vigilantismo e a quebra da privacidade. Prejudica a liberdade de fluxos e a criatividade.
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Impõe o medo de expandir as redes.
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O artigo 22 do projeto deve ser integralmente REJEITADO.
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(iii) Art. 22Art. 22. O responsável pelo provimento de acesso a rede decomputadores é obrigado a:I - manter em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de três anos, com o objetivo de provimento de investigação pública formalizada, os dados de endereçamento eletrônico daorigem, hora, data e a referência GMT da conexão efetuada por meio de rede de computadores e por esta gerados, e fornecê-los exclusivamente à autoridade investigatória mediante préviarequisição judicial;
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II - preservar imediatamente, após requisição judicial, no curso de investigação, os dados de que cuida o inciso I deste artigo e outras informações requisitadas por aquela investigação, respondendo civil e penalmente pela sua absolutaconfidencialidade e inviolabilidade;
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III - informar, de maneira sigilosa, à autoridade competente, denúncia da qual tenha tomado conhecimento e que contenha indícios da prática de crime sujeito a acionamento penal públicoincondicionado, cuja perpetração haja ocorrido no âmbito da rede de computadores sob sua responsabilidade.
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§ 1° Os dados de que cuida o inciso I deste artigo, as condições de segurança de sua guarda, a auditoria à qual serão submetidos e a autoridade competente responsável pela auditoria, serãodefinidos nos termos de regulamento.

§ 2° O responsável citado no caput deste artigo, independentemente do ressarcimento por perdas e danos ao lesado, estará sujeito ao pagamento de multa variável de R$2.000,00 (dois mil reais) a R$ 100.000,00 (cem mil reais) a cada requisição, aplicada em dobro em caso de reincidência, que será imposta pela autoridade judicial desatendida, considerando-se a natureza, a gravidade e o prejuízo resultante da infração, assegurada a oportunidade de ampla defesa e contraditório.

§ 3° Os recursos financeiros resultantes do recolhimento das multas estabelecidas neste artigo serão destinados ao Fundo Nacional de Segurança Pública, de que trata a Lei n° 10.201, de14 de fevereira de 2001.
VEJA O OUTRO exemplo de artigo aprovado no PLC:

(i) Art. 2o (ref. art. 285-A)Art. 285-A. Acessar rede de computadores, dispositivo de comunicação ou sistema informatizado, sem autorização do legítimo titular, quando exigida:Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.Parágrafo único. Se o agente se vale de nome falso ou da utilização de identidade de terceiros para a prática do crime, a pena é aumentada de sexta parte.Este artigo criminaliza o uso de redes P2P e até mesmo a cópia de uma música em um i-pod. Ao escrever que o acesso a um "dispositivo de comunicação" e "sistema informatizado" sem autorização do "legítimo titular", ele envolve absolutamente todo tipo de aparato eletrônico. Se a empresa fonográfica escreve, nas licenças das músicas que comercializa, que não admite a cópia de uma trilha de seu CD para um aparelho móvel, mesmo que seu detentor tenha pago pela licença, estará cometendo um crime PASSÍVEL DE PENA DE RECLUSÃO DE 1 A 3 ANOS. O projeto de lei é tão absurdo que iguala os adolescentes que compartilham músicas aos crackers e suas quadrilhas que invadem as contas bancárias de cidadãos ou o banco de dados da previdência.

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