domingo, 13 de abril de 2008

O país que se considera o mais livre do mundo é o recordista em prisões (e prisões Negras)

É estarrecedor o dado de que a população de presidiários dos EUA chega a uma proporção de praticamente 1 a cada 100 habitantes. Segundo dados publicados pelo The New York Times, resultados de um estudo realizado pelo Pew Researcher Center, a população dentro das prisões cresceu em 25 mil no ano passado, criando um total de 1.6 milhão. Outras 723 mil pessoas estão em cadeias locais. O número de adultos americanos é de cerca de 230 milhões, ou seja, precisamente, um em cada 99,1 adultos está preso.

Os índices de prisão são ainda maiores para alguns grupos, reflectindo uma realidade que vai além da questão criminal, açambarcando um campo delicado para o "país das liberdades e da igualdade". Um em cada 36 hispânicos adultos (os imigrantes mais comuns nos EUA) está atrás das grades. Entre os homens, um em cada em cada nove negros entre 20 e 34 anos está preso.

O relatório, feito pelo Pew Center, também descobriu que apenas uma em cada 355 mulheres brancas entre 35 e 39 anos está presa, assim como uma em cada 100 negras também.

A metodologia do relatório se diferenciou do usado pelo departamento de Justiça, que calcula o índice de pessoas presas usando a população total ao invés da população adulta como denominador. Com a metodologia do departamento, cerca de um em cada 130 americanos está preso.

Esses números alarmantes são o resultado da guerra às drogas dos anos 80. Em 1988, uma pesquisa mostrou que dois terços dos americanos aceitavam abrir mão de parte de sua liberdade se fosse esse o preço da vitória contra o crime. De lá para cá a criminalidade caiu rapidamente. Em todo o país, os índices de criminalidade voltaram aos números dos anos 60. Mas, nem por isso a população carcerária tende a cair. Como o uso de drogas cresce entre os jovens, e com as penas de prisão obrigatórias para quem é pego com drogas, a a superlotação das cadeias está garantida.

Nos anos 80 acreditava-se que o Crack era uma epidemia que ameaçava o país. Entre 1985 e 1995, o número de negros presos por drogas cresceu 707% contra 306% entre os brancos. Segundo o departamento de Justiça, 8,3% dos jovens negros entre 25 e 29 anos estão na cadeia contra 0,8% de brancos da mesma faixa etária. O encarceramento dos jovens negros agrava o problema do desemprego crónico nos guetos. Dificilmente um jovem que passou alguns anos na cadeia consegue emprego.

Os negros são apenas 12% da população americana, mas representam 60% dos condenados por uso ou tráfico de drogas. O departamento de Justiça prevê que no ano que vem os negros presos serão 1,43 milhão, ou seja, 70% de toda a população carcerária. As penas de prisão para os negros são mais longas. Nos crimes de estupro, por exemplo, verificou-se que em média os presos negros cumprem penas de 70 meses contra 56 para os estupradores brancos. Por qual motivo objectivo? Por serem negros! Está na pele.

A guerra às drogas iniciada nos anos 80 multiplicou os presídios, mas não reduziu o uso das drogas. Da população acima de 12 anos, 33% já usou Cannabis, a droga mais popular. Entretanto, o consumo dessa droga nunca ultrapassou 0,5% da população. Agora os governantes reconhecem o fracasso dessa guerra e buscam novas alternativas. Mas o encarceramento maciço da população dos guetos continua e ameaça agravar os problemas sociais das grandes cidades americanas.

Esta não é uma questão que pode ser lida apenas pelo vies da criminalidade. Este factor serve apenas para justificar interesses escusos que nunca são claramente apresentados. A crescente privatização do sistema prisional americano faz com que interesses lobistas de empresários do sector não permitam que os Senadores Congressistas americanos aprovem leis mais brandas e políticas alternativas para o combate ao uso de drogas e a criminalização no país. Para estes, o inchamento dos presídios é sinal de lucro garantido, uma vez que o custo é pago pela população, através do governo.

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Adalto,
Parabéns pela reflexão e contextualização do assunto. Pela busca de um mundo mais igualitário, justo e humano. Peço permissão de extrair seus textos para trabalhar com os meus alunos em Recife. Particularmente, aprecio-os.
Os dados são preocupantes, dignos de uma reflexão minuciosa e crítica com relação aos Cáceres privados nos Estados Unidos. Os resultados apontam que há um interesse de manter humanos na cadeia. Que providências o governo americano tomará para reverter esses dados? Segundo Barata a gênese do racismo, tanto na América Latina como nos Estados Unidos, não é endógena, não é proveniente da cultura nem da ideologia, na verdade ela tem raízes evidentemente econômicas. Os dados mostram o interesse de uma sociedade que cultua no discurso teórico a liberdade humana, sendo que na prática percebemos resultados, no mínimo constrangedores.
Nilton Oliveira