terça-feira, 2 de junho de 2009

Cegueira metafórica, realidade social concreta!


Saramago, em seu livro “Ensaio Sobre a Cegueira” descreve uma metáfora bastante lúcida da incapacidade humana em construir laços de solidariedade, mesmo diante de uma tragédia comum. O escritor português relata com bastante sensibilidade como as pulsões mais instintivas e/ou bárbaras corroem uma sociedade pautada no desprezo à vida e ao seu semelhante. Uma explosão anômica sem precedentes, que não escolhe grupo social, gênero ou etnia.

A lógica da cegueira humana se configura, nesta direção, na incompreensão coletiva de como se engendram todas as formas de exploração de homens, mulheres e crianças; o porquê de existir tanta desigualdade social e concentração de renda; e a naturalização da violência e suas dimensões físicas e simbólicas. É esta mesma cegueira que inviabiliza lutas sociais mais conscientes; que lança à margem aqueles que nunca terão acesso ao processo de escolarização e que, por esta mesma razão, correm o risco de serem inempregáveis e mais propensos à indigência.

Contraditoriamente, combatemos exaustivamente, nossos pares. Plantamos e semeamos a discórdia e nos vangloriamos de representarmos lideranças desagregadoras. Sabotamos projetos alheios e nos aliamos a determinadas concepções políticas que favorecem a acumulação do capital privado à custa da produção coletiva pública. Nossos interesses se definem tão-somente naquilo que é mais mediato e, portanto, totalmente descolado dos nexos históricos que medeiam nossas relações laborais e afetivas.

Uma sociedade sitiada pela cegueira metafórica é promotora de todos os desmandos nas realidades políticas, econômicas e cultural; não por acaso, o mundo está em crise pela arrogância dos “mercadores de almas”, que decidem quem poderá comer hoje e amanhã. Os danos são irreparáveis e inconseqüentes. E enquanto isso, os cegos marcham incólumes, embrutecidos, esperando quem sabe, uma redenção metafísica atemporal, anistórica, desprovida de toda e qualquer materialidade.

2 comentários:

Juliana Bandite disse...

Texto maravilhoso!

Cris Moura disse...

achei uma visão um tanto demasiado pessimista. em geral, tuas mensagens são sempre voltadas ao otimismo nessa fiquei meio deprê quando terminei de ler. Ui, ui, ui, será que a europa tá te tornando mesmo um tal utópico angustiado, como fala no teu perfil? Cristiane Moura